terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

À Volta com a Vida: O caso da deputada bêbeda



O caso da deputada bêbeda

Para usar um jargão idiota, o caso da deputada bêbeda tem três camadas de leitura. Na primeira camada, à superfície, podemos observar que esta estória foi mais uma acha para a fogueira populista. O Mr. Tuga adora odiar a política e os políticos, sobretudo os deputados, esses cochiladores profissionais. Repare-se que este sentimento não produz críticas a políticos ou políticas em concreto. Nada disso. Este ódio é uma bulldozer. A malta saliva contra "eles", "eles" são os culpados por tudo; bastava que "eles" ficassem sem as reformas e sem os motoristas para que "isto fosse ao sítio". Através deste populismo, Mr. Tuga pode pensar que "eles" são os únicos culpados, a sociedade não tem culpa, as famílias não têm culpa, as pessoas não têm culpa. A culpa é só "deles".

Na segunda camada, encontramos o óbvio ululante: Glória Araújo devia ter pedido a demissão, mas não pediu. A dra. Araújo não conhece o significado da expressão prestação-de-contas. E o PS também não. Quando um deputado é apanhado com uma taxa de alcoolemia de taberneiro, o partido desse deputado só tem um caminho: mostrar a porta da rua ao bebedolas. Nada disto aconteceu. A falta de vergonha da Dr. Araújo e a falta de vergonha institucional do PS elevaram a vida da pátria a novos níveis de comicidade. Sim, comicidade. O riso é, aliás, a marca da terceira e última visão sobre este caso.

Quando ouvi a estória pela primeira vez, desatei a rir. O meu primeiro instinto não foi a indignação, foi a risota, e aposto que não fiquei sozinho. Nos dias seguintes, as conversas sobre o assunto também acabaram na risota. Ora, a diferença está aqui: uma conversa entre americanos ou alemães sobre um caso semelhante nunca acaba no gozo, acaba mesmo em indignação, em accountability, em gesellschaft, em pedidos de demissão. Perdemos nesta comparação? Sim, por 5-0. Em Portugal, as pessoas só se indignam a sério quando o assunto cheira a dinheiro. Uma deputada bêbeda, bah, um pormenor. É mau? Sim. Tenho vergonha disto? Tenho. Mas esta moleza portuguesa tem um lado positivo: não somos puritanos. Acompanhar a política americana é o mesmo que acompanhar uma cascata de casos pessoais (amorosos e de outra espécie) sem relação com a esfera pública. A perseguição da cama alheia transforma a atmosfera pública dos EUA numa coisa infantil. E, atenção, esta infantilidade gera casos tão patéticos como a não-demissão da nossa deputada bêbeda.

Fonte: ESPRESSO Online

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