Cada um Cumpre o Destino que lhe Cumpre
Cada um cumpre o destino que lhe cumpre,
E deseja o destino que deseja;
Nem cumpre o que deseja,
Nem deseja o que cumpre.
Como as pedras na orla dos canteiros
O Fado nos dispõe, e ali ficamos;
Que a Sorte nos fez postos
Onde houvemos de sê-lo.
Não tenhamos melhor conhecimento
Do que nos coube que de que nos coube.
Cumpramos o que somos.
Nada mais nos é dado.
E deseja o destino que deseja;
Nem cumpre o que deseja,
Nem deseja o que cumpre.
Como as pedras na orla dos canteiros
O Fado nos dispõe, e ali ficamos;
Que a Sorte nos fez postos
Onde houvemos de sê-lo.
Não tenhamos melhor conhecimento
Do que nos coube que de que nos coube.
Cumpramos o que somos.
Nada mais nos é dado.
Análise do Poema
Ricardo Reis é o heterónimo clássico de Fernando Pessoa, onde se digladiam forças simultaneamente opositoras e complementares, na forma como ele pensa a realidade mas ao mesmo tempo luta por aceitá-la voluntariamente.
A ode em questão fala de um tema fascinante em Ricardo Reis – o Destino. Seria necessário falarmos de diversos outros temas complementares para entendermos na sua totalidade a força deste tema na obra de Ricardo Reis, mas analisada separadamente podemos dizer dele o seguinte:
O Destino é para Reis "algo" acima dos deuses, algo que subjuga os deuses e os homens. Por isso mesmo, o Destino assume grande importância na filosofia de vida de Reis: é através da consciência do Destino que Reis decide a fundamental atitude de aceitar a vida como ela é (estoicismo), tirando dela apenas os prazeres simples que pode retirar (epicurismo).
É disto que Reis fala na ode que analisamos: do modo como não cumprimos o que desejamos (ou seja, não conseguimos o que desejamos) nem desejamos o que cumprimos. É o Destino que decide por nós, e nós apenas cumprimos a vontade do Destino – raiz superior da vida humana e da vida divina.
"Cumpramos o que somos / Nada mais nos é dado" é a afirmação fria e final deste princípio basilar de Reis. Para quê desejar mais se nada mais podemos ter como nosso? A procura de desejos fúteis é encarada como Reis como o principal obstáculo em atingir a verdade, uma verdade mais simples e essencial – uma verdade quase nula, mas absoluta na sua congruência com o que é o Destino dos homens.
Simultaneamente redutora, esta filosofia, por retirar ambição ao homem, deita-o a um novo caminho. De novo reforço que seria necessária uma mais longa análise para total consciência da importância destes princípios. Mas aqui afloramos alguns pontos iniciais, que com certeza dão para aguçar a curiosidade de quem lê.
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